sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

ENTIDADE FILANTRÓPICA QUE NÃO DEPOSITAVA FGTS VAI PAGAR EXPURGOS INFLACIONÁRIOS

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho restabeleceu sentença que condenou a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo a pagar a uma enfermeira o valor equivalente aos depósitos de FGTS não realizados mês a mês de 1971 a 1989, com o acréscimo das diferenças dos expurgos inflacionários (diferença entre a correção da poupança e o índice oficial de inflação) referentes aos Planos Verão e Collor 1. A correção monetária dos expurgos compete à Caixa Econômica Federal (CEF), mas apenas quando os depósitos são efetuados na época própria, o que não ocorreu.
Resultado de imagem para Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo

Até 1989, as entidades filantrópicas, por força do Decreto-Lei 194/67, eram gestoras dos valores relativos aos depósitos do FGTS, e estavam desobrigadas de efetuá-los mensalmente na conta vinculada. Na extinção do contrato de trabalho ou aposentadoria, os valores deveriam ser repassados aos trabalhadores, corrigidos e com juros. A partir da Lei 7.839/89, a gestão do fundo passou à CEF.


A enfermeira que ajuizou a ação buscava a aplicação do índice de 44,48% no período de abril de 1971 a setembro de 1989. Ela recebeu o total referente aos depósitos logo após se aposentar, em 1996, mas continuou trabalhando até março de 2013. Ela alegou que foi prejudicada por não receber as diferenças dos expurgos inflacionários porque somente a partir de outubro de 1989 a entidade passou a recolher os valores de FGTS junto à CEF.


O juízo de primeira instância decidiu que a Santa Casa deveria arcar com o pagamento da correção monetária dos expurgos inflacionários, pois a conta vinculada da enfermeira não se beneficiou, pela ausência dos depósitos, dos acréscimos monetários derivados dos Planos Verão e Collor 1. Ao julgar recurso, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) condenou a empregadora ao pagamento da diferença de FGTS decorrente da aplicação do índice de 16,64% em fevereiro de 1989, mas afastou sua responsabilidade pela aplicação do índice de 44,48% de abril de 1990, que caberia à CEF.


No recurso ao TST, a enfermeira alegou que os valores eram mantidos sob a responsabilidade da empregadora, e não da Caixa, no período pleiteado e, por isso, a Santa Casa é quem deve responder pelo pagamento dos expurgos inflacionários. Sustentou que sobre os depósitos pagos diretamente quando de sua aposentadoria, referentes ao período de janeiro de 1979 a setembro de 1989, deveriam incidir todos os índices inflacionários aplicados pela CEF, inclusive aqueles indicados na Lei Complementar 110/01, que autorizou créditos de complementos de atualização monetária em contas vinculadas do FGTS.


TST


Segundo a relatora do recurso de revista, ministra Maria Cristina Peduzzi, a entidade filantrópica que opta por não efetuar os depósitos do FGTS mês a mês, gozando da benesse do Decreto-Lei 194/67, deve pagar ao empregado, ao final do contrato, o valor equivalente a esses depósitos, fazendo incidir as diferenças decorrentes dos expurgos inflacionários. Não cabe à Caixa Econômica Federal corrigir valores do FGTS referentes a período anterior à sua gestão, afirmou.


Para Cristina Peduzzi, o Tribunal Regional, ao julgar ser da CEF a responsabilidade pelo pagamento das diferenças, contrariou a jurisprudência do TST. Em seu voto, ela cita diversos precedentes no sentido de que o pagamento cabe à entidade filantrópica.


Processo: RR-37-80.2014.5.02.0058


Fonte: Tribunal Superior do Trabalho

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

EMPRESA É CONDENADA EM R$ 300 MIL POR DISCRIMINAÇÃO CONTRA OS BAIANOS

A 36ª Vara do Trabalho de Salvador condenou a Bematech S/A, empresa que fabrica equipamentos e softwares de gestão com sede em Curitiba (PR) e filial na capital baiana, a pagar R$ 300 mil por assédio moral, caracterizado na ação de gerentes que insultavam, constrangiam e humilhavam os demais funcionários, usando expressões como baiano lerdo. A sentença, expedida em ação movida pelo Ministério Público do Trabalho na Bahia (MPT-BA), também proibiu a empresa de permitir que se ofenda a honra, a moral ou a dignidade de seus empregados.

Resultado de imagem para Bematech S/A
Testemunhas ouvidas confirmaram a humilhação praticada pelos gerentes, que utilizavam expressões racistas - e sobretudo preconceituosas contra a Bahia - para se dirigir aos subordinados, como preguiçosos, lerdos, moles, devagar. Atitudes discriminatórias convenceram a Justiça da prática do assédio moral, caracterizado por violência psicológica, constrangimento e humilhação, o que leva a vítima a situações incômodas e à desestabilização emocional, sobretudo quando se prolongam no tempo.


Na decisão, a juíza Lucyenne Amélia de Quadros Veiga reconheceu que as ofensas proferidas eram de responsabilidade da empresa, que não adotou qualquer medida para evitar a prática. As expressões usadas reiteradamente revelavam discriminação de origem, pois atingiam todo o povo da Bahia, buscando referir-se à suposta incompetência e ineficiência dos funcionários.


O valor a ser pago, fixado como compensação punitiva, para evitar a reincidência dessa prática, será revertido ao Fundo de Promoção do Trabalho Decente, à Associação de Pais e Amigos de Crianças e Adolescentes com Distúrbios de Comportamento e ao Lar Irmã Benedita Camurugi - R$ 100 mil para cada. A empresa não mais possui filial em Salvador, o que não tira dela a responsabilidade de pagar pelo dano moral causado.


Em defesa, a Bematech alegou que sempre cumpriu determinações legais. Testemunhas de defesa também prestaram depoimento, o que não foi suficiente para desconstituir a prova testemunhal produzida pelo MPT. A Bematech alegou também que um de seus gestores era nordestino, mas a juíza considerou que o argumento não leva à conclusão de que, por este motivo, um nordestino não ofenderia outro, até porque, infelizmente, não raro um oprimido assume o lado do opressor. A empresa também deverá elaborar programa permanente de prevenção ao assédio moral e promover palestras sobre práticas discriminatórias. Ainda cabe recurso da decisão.


A ação do MPT, conduzida pelo procurador Rômulo Almeida, foi instruída com documentos obtidos na reclamatória trabalhista nº 0000078-61.2011.5.05.002, cuja sentença reconheceu a prática do assédio e condenou a mesma empresa por dano moral. A decisão desta reclamatória foi confirmada em segunda instância, com base no comportamento discriminatório reiterado da Bematech S/A, em claro abuso do poder diretivo e disciplinar.


DIVERSIDADE- A sentença da juíza Lucyenne Veiga destaca que o estigma do baiano lerdo, preguiçoso e com aversão ao trabalho não possui qualquer dado de realidade. Na verdade, segundo estudos antropológicos, o estigma de preguiçoso do baiano teve origem na elite branca que dominava o Brasil na época da escravidão dos negros e era usada para desdenhar desses escravos que laboravam até a exaustão, pontuou. Ela levou em conta que o estereótipo atinge principalmente a classe trabalhadora, mas o povo baiano, assim como os demais brasileiros, é um povo trabalhador, forte e resiliente, com grande capacidade de adaptação.


A magistrada também ponderou que o Brasil vive um momento em que os cidadãos deveriam unir esforços em combate aos retrocessos sociais, em aceitação à diversidade do ser humano e do próprio país, cujas regiões apresentam diferentes peculiaridades culturais, não se podendo afirmar de modo algum que uma região é melhor que outra.


Para a juíza, o estereótipo Dorival Caymmi de que o baiano só quer festa, rede e água de coco não merece prosperar. A arte e poesia de Caymmi, com liberdade criativa, não pode jamais servir para definir um grupo social, completa. A decisão também aponta estudos, como o artigo Uma Verdade sobre o Povo Baiano, de Leandro Isola, e uma tese de doutorado da professora Elizete Zanlorenzi, da PUC de Campinas, que apontam o descompasso entre a realidade e a imagem que se tem do baiano. Em apertada síntese, demonstram que a preguiça baiana não passa de uma faceta do racismo.


Processo nº 0001340-80.2015.5.05.0036


Fonte: Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região